No último artigo sobre acessibilidade, que você pode acessar no link:
http://cnclp.com.br/2023/04/24/acessibilidade-essa-palavrinha-e-os-riscos-reais-do-cotidiano/20/38/
encerrei falando que ainda haveria muito a se dizer sobre o assunto e que, em outra oportunidade, discorreria um pouco mais sobre o tema, para não tornar o texto nem cansativo nem muito maçante. Pois bem, nesse método de “conta-gotas”, assim como a evolução da acessibilidade também o é, falarei hoje sobre acessibilidade digital. Não por acaso, mas sim pelo fato de que hoje, uma terceira quinta-feira do mês de maio, se comemora o “Dia Mundial de Conscientização da Acessibilidade Digital”, criado em 2012 por Joe Devon, um americano desenvolvedor de software da Califórnia, Estados Unidos. Também por conta da data, a Apple anunciou, embora não tenha detalhado, diversas implementações de acessibilidade para as próximas versões do sistema operacional da maçã que roda nos equipamentos Mac: IPhone, IPad e Apple Watch.
Porém, focando apenas na deficiência visual, nós usuários e consumidores de conteúdo digital sabemos que ainda está muito distante a acessibilidade total de produtos como aplicativos para dispositivos móveis e páginas web na grande maioria dos sites. Falta descrição nas imagens apresentadas nesses mesmos sites, há ausência de audiodescrição em quase todos os filmes nas salas de cinemas e TVs, programas e séries, faltam máquinas de pagamento com cartão equipadas com touch screen, entre tantas outras coisas com as quais nos deparamos e nos frustramos no dia a dia. Seria tão simples se as empresas desenvolvedoras de sites e aplicativos se baseassem nas diretrizes de acessibilidade WCAG (Web Content Accessibility Guidelines), desenvolvidas pelo W3C (World Wide Web Consortium), e no EMAG (Modelo de Acessibilidade em Governo Eletrônico), este mais voltado ao desenvolvimento de páginas governamentais, que normatizam e parametrizam toda a construção de conteúdos acessíveis na Internet!
Sou defensor ferrenho da tecnologia para nós cegos, pois penso que ela veio contribuir e muito com grande parte de nossa independência e autonomia, mas isso não significa que devamos nos acomodar com o que temos até agora, porque ao nos acomodarmos não progredimos. Com certeza essa questão da tecnologia tem muito ainda a melhorar para nós, com a expansão da inteligência artificial e o surgimento de novos dispositivos e produtos que venham a facilitar nossas vidas. Se lembrarmos alguns anos atrás, quando nada disso existia, como computadores, smartphones com diversos aplicativos instalados, entre outros dispositivos, um cego tinha muitas dificuldades e sua independência era bastante comprometida. Não estou dizendo que hoje esteja tudo lindo e maravilhoso para nós, nem quero dizer que todos os cegos ou deficientes visuais têm acesso a tudo que está disponível no mercado, muito pelo contrário. Mas penso que isso não seja culpa da tecnologia e sim da falta de políticas públicas apropriadas, como a isenção de impostos sobre tecnologias assistivas, por exemplo, que favoreçam a aquisição dessas facilidades as quais, embora não resolvam todos nossos problemas, pelo menos nos dão mais autonomia e independência.
Fico aqui na torcida para que esta terceira quinta-feira de maio de 2023 seja um marco e que, no futuro, ouçamos falar que, naquele longínquo dia 18 de maio, empresários, políticos e a sociedade como um todo decidiram se multiplicar em muitos Joe Devon’s, tornando a vida das pessoas com deficiência um pouco mais fácil, organizando-se em torno de um assunto que só é lembrado em dias específicos e do qual, já no dia seguinte, não se fala mais a respeito. Espero muito mesmo que esse “Dia Mundial de Conscientização da Acessibilidade Digital” se cristalize na consciência de todos nós, no decorrer dos 365 dias de todos os anos, nos fazendo pensar nessa minoria tão invisível e pouquíssimo lembrada por todos, às vezes até por nós mesmos que fazemos parte dela.
Temos que conseguir chegar a esse patamar de conscientização da sociedade. Nada em nossas vidas, sejamos deficientes ou não, é conquistado sem lutas e sacrifícios. Portanto, se quisermos algo melhor para nós, devemos cobrar dessa sociedade tantas vezes apática, devemos cobrar dos políticos a quem destinamos nossos votos, e, por fim, devemos cobrar de nós mesmos. Será que estamos fazendo alguma coisa para melhorar a nossa vida e a vida do outro? Fica a pergunta para incomodar um pouco as nossas consciências tranquilas.
MARCOS RICIERI É ANALISTA DE SISTEMAS E EDITOR DO SITE CNCLP